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domingo, 3 de maio de 2015

POEMA DO DOMINGO




Cuspe de Satã

Meus olhos estão cansados.
Recebi o cuspe de Satã no olho esquerdo,
gosma de cobra peçonhenta que,
sem dó nem ré ou mi,
fatalmente fechará o véu
para tornar poesia
o que um dia foi retina e rotina.

A cara cortada de picadas de corvos imaginários,
vendo por um olho só
os tarôs e venenos, suspiros e degredos,
signos e medos.

Pressão intraocular batendo
em horas desencontradas,
alfinetes nas encruzilhadas
dos meus devaneios,
alicate da neuropatia óptica
provocando lesões de ninfas e dragões.

A retina queima e se mostra faminta
como as últimas moscas do verão.
O vermelho dos meus olhos
não cabe nas faces de Marte
ou nos espelhos do sol..

Quando enfim, fechar os olhos,
devo lembrar de cenas amontoadas,
misturadas, sem sequência,
com as chuchadas da pressão ocular
a me lembrar que ali restam cinzas
de antigos sonhos de visão e agora,
nervos óticos mortos como lápides
a lamentar o que não foi possível ver e rever.

Não deu tempo, e nem poderei chorar,
que os cegos não choram,
apenas tentam expulsar o que sobrou
de antigas imagens na sua cabeça
de cego que quis ser vidente um dia.

F. Mozart

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