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quinta-feira, 12 de março de 2015


Vinicius de Moraes escreveu “O poeta aprendiz”, sobre um guri que tinha o senso da poesia, talvez o próprio poetinha aos dez anos de idade. Os poetas antigamente começavam a poetar nos cueiros, até chegar a um irretocável soneto já na idade senil. Ou morriam antes, sem cometer um verso sequer aproveitável. Hoje, é fácil e desagradável achar na rua, no salão de festa, até no bloco de carnaval, aquele chato que te tortura com uns versos “pé quebrado” no pé do ouvido, sem suspeitar que é apenas uma anta de um poetastro.

Uma dessas antas aprendizes de poeta me pegou de chofre com essa interessante questão:

--- Você que é metido a poeta, me diga que palavra devo usar no lugar de “murcha”, que é uma expressão banal, não cabe no meu poema: “Nos teus olhos eu vi / um buquê com duas flores / murchas.”

--- Primeiro, eu não sou metido a poeta. Poeta mesmo é João Cabral de Melo Neto, e metido a poeta pode ser Ronaldo Cunha Lima. Se muito, sou um pereba que cometeu meia dúzia de quatro versos murchos algum dia, mas se redimiu do crime a tempo. Segundo, vai depender do sentido do verso, do que você tenta dizer com esse negócio de buquê no olho.  

O cara declarou que queria florear a sua poesia. Desses que acham que poesia tem que ter palavra bonita, rima rica de Brasil com varonil e alguma flor enfeitando o nada. Há quem veja uma beleza entranhada na mediocridade. Eu, alma rude, só vejo burrice mesmo. No caso, eu queria contribuir substancialmente para que a humanidade se livrasse daquele futuro monstro travestido de poeta.

--- Rapaz, quer um conselho? Deixe essa merda de flor murcha mesmo. É mais interessante para o contexto. O verso não vale nada de qualquer jeito.

O aprendiz de poeta me chamou de cretino e ignorante das coisas poéticas e desconhecedor das palavras flácidas. Melancólicas? Triste? Flores mirradas? Não adiantou. Por mais que eu tentasse uma palavra adequada para regar a flor murcha do sujeito, fui obrigado a admitir que aquele emurchecido vegetal guardava um quê de formosura na sua imagem de fina flor do kitsch romântico popular.

O aprendiz de poesia brega encerrou a consulta, crente que eu zombava de propósito de seu trabalho jeca ridículo. Não sei se já mencionei que esse cara é estrangeiro, dono de uma inveja sadia de nossos poetas. No seu país, talvez não conheça nenhum. Quer ser poeta em português, coisa que o redime de alguma forma. Claro que não veio da Europa cosmopolita, é gente aqui do terceiro mundo que jamais leu Neruda nem se importa com o que diz Florbela Espanca. Sente uma inveja sadia de nossos poetas tipo J.G. de Araújo Jorge, o mais amoroso e brega sonetista brasileiro. Seja como for, o cara anda lendo poesia, o que o torna melhor em todos os sentidos. Desenvolve  áreas intelectuais, emocionais e sociais, mesmo empacando em flores caprichosamente brochas em buquês estrambóticos. Menos mal.



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