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segunda-feira, 14 de abril de 2014

Enquadrando a poesia


Se fosse na Rússia antiga, do tempo do comunismo, o poeta Manoel Xudu poderia ser condenado a trabalhos forçados por “parasitismo social” como aconteceu com Joseph Brodsky, Prêmio Nobel de Literatura. Ainda hoje existe o preconceito contra os poetas repentistas, que são vagabundos, que gostam de beber.

Na velha Itabaiana do Norte, Manoel Xudu armou sua tenda na feira, tocando viola para seus ouvintes fiéis. De repente chega um fiscal com feições pouco amigáveis.

--- O senhor tem autorização pra cantar nesta feira? Saiba que todo mundo aqui paga imposto pra trabalhar. Tem licença? Qual sua profissão?

--- Sou poeta.

--- Sim, eu sei, mas tem um trabalho regular?

--- Pensei que ser poeta era um trabalho regular.

--- Poeta não é profissão, e além do mais, quem disse que você é poeta?

--- Ninguém.

Diante da mesma pergunta de um juiz na Rússia dos bolcheviques, o poeta Joseph Brodsky respondeu:

--- Quem me incluiu na lista dos seres humanos?

Xudu se viu livre do fiscal, que saiu resmungando contrariado e não ouviu o verso do poeta:

Com meu canto desencanto de guerreiro
Vou seguindo esse meu rastro de palavra
Vou pregando no deserto, é minha lavra,
Meu trabalho, minha sina e meu terreiro.

Graduado pela vida e licenciado em poesia, Manuel Xudu não tinha carteira assinada nem era contribuinte do instituto de previdência, tanto que morreu na pindaíba. A poesia é assim um troço que obriga você a sair do óbvio. Xudu vivia de seus poemas e olhava o mundo através das nuvens da zinebra que ele bebia e chamava de Endorfina ou Encefalina.

Diante dos representantes da Ordem, o mais sábio dos homens não sabe direito como agir. No julgamento de Jesus, Pilatos perguntou:

--- O que é a verdade?

Jesus não respondeu a essa pergunta do político burocrata.


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