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sábado, 27 de abril de 2013

Futebol cidadão

Garotos do meu time de futebol em Mari



“Confesso que me fatiguei um pouco; que importa! Combatemos, vencemos, isso é o que importa”. N. Kazantikakis

“Cuide só da sua vida”, dizia minha mãe. Quando fui viajar pelo mundo a pé, ela aconselhou: “Não fale com estranhos”. Não dou trela a estranhos, mas não cuido só de minha vida.

Quando cheguei na pequena cidade de Mari em 1988 para assumir o cargo de Chefe da estaçãozinha de trem, passei a cuidar da vida dos outros, um tanto por não ter muito o que fazer na repartição.

Entre as muitas ações, me meti com futebol. Tomei conta de um time por nome Canteiro. Ensinava rudimentos do futebol a um bando de garotos de sete a onze anos, incluindo meu filho Arnaud Neto.

Uma discreta lágrima correu pelo meu rosto nesta sexta-feira. Foi no bar de Zé. Cheguei, me abanquei e pedi uma cerveja. Só um freguês no recinto, tomando sua gelada, calado. De repente, puxou conversa. Disse que era de Mari. Morava agora em Cruz das Armas, padeiro de profissão. À guisa de maiores esclarecimentos, me apresentei como cidadão honorário de Mari onde morei por 12 anos. O homem abriu um sorrisão. Quase não acreditou quando eu disse que era o antigo chefe da estação ferroviária.

--- Você mudou demais, ta mais gordo, sem barba e sem cabelos grandes – espantou-se.

Foi quando confessou que devia ao antigo técnico uma dívida de honra. Seu filho Hozanan, de quem eu nem lembrava mais, jogava no meu time.

--- Ele era preguiçoso pra estudar, mas depois que foi jogar no Canteiro, avançou nos estudos porque dizia que seu Fábio exigia boas notas para fazer parte da equipe. Hoje é um pai de família, estudou, se deu bem na vida, e isso em parte devo a você – revelou o padeiro.

Chiquinho Padeiro, o nome da fera, pai de Hozanan meu ex-pupilo, permita que eu faça esse registro público da satisfação em saber que esse Leão rabugento, mas de coração mole, ajudou crianças a tomar gosto pelos estudos através do esporte.

Acho que já contei aqui essa história de minhas aventuras como cartola e técnico de futebol em Mari pela centéssima quinquagésima vez. Não vou repetir, prometo. Apenas permitam consignar por escrito uma frase de minha autoria que foi eu mesmo que pensei: “Nosso futebol arte perdeu para o futebol malandragem e o futebol mercenário, entretanto, o futebol cidadão jamais colherá mal resultado”.


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