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quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

COLUNA DE ADEILDO VIEIRA




Não há monólogos entre nós dois       
Adeildo Vieira

Pra que serve mesmo o artista? Seria ele um mero diletante, untador de creme na tez de sua vaidade, adorador irreparável de seu próprio umbigo? Estaria um artista submisso à solidão de seus abismos e refém exclusivo de obscuras introjeções de seus rompantes de felicidade?  Ao manifestar sua arte, estaria o artista buscando ecos do mundo para soar na sala vip de si mesmo? Bom, considerando a complexidade do ser humano, tudo isso é até possível. Mas eu não hesito em afirmar que o artista exercita seu trabalho numa insustentável necessidade de se expressar, buscando conexões possíveis com o mundo que investiga. E nesse exercício carrega a humanidade em seus vieses mais profundos, aqueles que, de tão subjetivos, nos caracterizam como pessoa humana. Longe de ser solitária, esta é uma labuta de muitas vias, de trato coletivo.
Negue-se ao artista o direito ou oportunidade de se manifestar e se estará privando aos outros de se relacionar com suas ideias, seus conflitos, suas propostas visionárias de mundo, sua competência ou até absoluta incompetência de manipular a linguagem que escolheu para se expressar. Construam-se muros que barrem os cometimentos de quem se preste a este ofício e cerrem-se as possibilidades da humanidade viver amplamente seus movimentos na busca de avanços.
Nunca me convidem pra empunhar meu instrumento como se me estivessem prestando um favor, como se o desejo de entoar minhas canções bastasse a mim mesmo. Faço canções pro mundo na certeza de que há muitos neste planeta azul que as desejam ouvir. Reivindico o direito sagrado dos outros interagirem com a linguagem que escolhi para chacoalhar-lhes os sentimentos e ideias. Reivindico, inclusive, o direito daqueles que precisam me ouvir para apresentar a sua mais veemente rejeição a meus propósitos artísticos. Este processo é necessário e só se faz possível quando se escancaram os portões da vida para os ricos diálogos da subjetividade humana. E neste traçado de teias de almas, é o artista quem manipula o tear dos dias. Não fosse assim a humanidade sucumbiria, esmagada sob as próprias botas, numa lógica cartesiana que nunca compreenderia as possibilidades de dois mais dois não resultar em quatro. Essa  subversão da aritmética é que traz a medida certa pra nossa existência.
Jamais me chamem pra manifestar meu sagrado ofício como se estivessem dando doce pra criança. Repudio quem subjuga, ou mesmo nega, essa valorosa relação do artista com o seu público ou com o público que deseja conquistar. Não respeito quem delega às mãos interesseiras do mercantilismo o julgamento sobre o interesse do público ante qualquer obra de qualquer artista. Não respeito quem acha que, ao manifestar sua arte, estaria o artista se locupletando desta oportunidade. Em nome da história reivindico a compreensão de que o mundo precisa dos artistas. De todos eles.

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